Ação da PF e suspeita de vazamento abrem crise entre Moraes e Aras

Operação deflagrada ontem contra empresários bolsonaristas, a pedido da Polícia Federal e por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal e presidente do Tribunal Superior Eleitoral, abriu uma crise com a Procuradoria-Geral da República. O ministro autorizou buscas e apreensões após trocas de mensagens entre empresários em um grupo de WhatsApp, com ameaças de golpe de Estado se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vencer a eleição. Celulares foram submetidos à análise.

Diálogos entre o procurador-geral Augusto Aras e investigados foram encontrados, de acordo com o site Jota. Após a divulgação da notícia, Aras disse a pessoas próximas estar tranquilo porque conversas mantidas com o empresário Meyer Joseph Nigri (Tecnisa), um dos investigados, foram triviais. Trataram de livros, obras de arte e vinhos.

O procurador-geral da República destacou ontem que não saberia nem mesmo precisar quando esses diálogos ocorreram e foram esporádicos.

Os mandados foram cumpridos após a coluna Guilherme Amado, do site Metrópoles, divulgar diálogos do grupo “Empresários & Política”, nos quais eles dizem, por exemplo, que preferem um golpe à volta do PT ao poder. Há, ainda, críticas ao Supremo. Augusto Aras afirmou que soube da operação ontem pela manhã. Moraes, por sua vez, contestou a informação e disse que a PGR foi intimada no dia anterior.

Em decisão de sexta-feira, o ministro quebrou, ainda, sigilos bancário e telemático (de mensagem), bloqueou contas e suspendeu perfis em redes sociais.

Os mandados foram cumpridos em dez endereços em São Paulo, Rio de Janeiro, Ceará, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. As ordens foram dadas no inquérito das milícias digitais, que mira a atuação de grupos organizados na internet para espalhar desinformação e ataques antidemocráticos.

Os alvos foram: Afrânio Barreira Filho (Coco Bambu); Ivan Wrobel (W3 Engenharia); José Isaac Peres (Multiplan); José Koury (shopping Barra World); Luciano Hang (Havan); Luiz André Tissot (Sierra Móveis); Marco Aurélio Raymundo (Mormaii); e Nigri. Os empresários reagiram à decisão de Moraes (mais informações nesta página).

Segundo o Jota, Augusto Aras, que acumula a PGR com a Procuradoria-Geral Eleitoral, trocou mensagens com Nigri, de quem é amigo.

O site afirmou que a informação foi confirmada com fontes do MPF, da PF e do STF. Há, de acordo com a reportagem, críticas em relação à atuação de Alexandre de Moraes e comentários sobre a candidatura de Jair Bolsonaro. Até o momento, as mensagens e o inquérito seguem sob sigilo e não há informações mais específicas sobre o teor da troca de mensagens.

Debandada

De acordo com um dos integrantes do grupo, havia 200 participantes no “Política & Empresários” – número que baixou para 70 na quarta-feira passada, quando as conversas vieram a público. Ontem, eram 40. O Portal Estadão ouviu de um dos integrantes que a saída ocorreu por “medo” da repercussão após a operação da Polícia Federal.

Alexandre de Moraes quer saber se os empresários financiaram algum tipo de manifestação contra as instituições. Dos oito investigados, quatro doaram um total de R$ 38,5 mil para as campanhas da família Bolsonaro em 2018, incluindo a do presidente Jair Bolsonaro (PL) e a do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).

No Palácio do Planalto, a avaliação é de que Alexandre de Moraes pretendeu criar um fato contra Jair Bolsonaro, mas o presidente não entrou no jogo do ministro. O presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou que a defesa de um golpe “é uma traição contra a Pátria”. Houve repercussão no meio político.

‘Não usual’

Em nota divulgada perto das 15 horas de ontem, a PGR afirmou que a totalidade da investigação ainda não havia sido remetida ao órgão para “ciência formal”. Aras alegou que “não houve intimação pessoal” da ordem judicial. A PGR afirmou, em nota, que ocorreu uma “entrega, em procedimento não usual, de cópia da decisão”, na tarde de ontem, em sala nas dependências do STF, onde funciona a unidade de apoio aos subprocuradores-gerais da República e ao PGR.

O Portal do Estadão apurou que o documento foi entregue a uma funcionária terceirizada. Nos bastidores da PGR, a comunicação sobre a decisão de Moraes foi vista como “fora do padrão”. Fontes ligadas ao órgão sustentam que o Ministério Público deve ser intimado pessoalmente.

Contestação

Em nota divulgada após o posicionamento da PGR, o gabinete de Moraes afirmou que a decisão foi entregue ao órgão às 14h41 de anteontem. “A referida decisão, posteriormente, foi encaminhada ao gabinete da vice-procuradora-geral da República (Lindôra Araújo) às 15h35, onde recebida às 16h40 do mesmo dia”, disse.

Não é a primeira vez que Alexandre de Moraes autoriza uma operação contra aliados bolsonaristas sem consultar o MP. A própria origem da investigação sobre os empresários bolsonaristas foi aberta contra a vontade da PGR. Aras já havia sugerido o arquivamento do inquérito dos atos antidemocráticos.

Bolsonaro vê fake news e Mourão ato arbitrário

Um dia antes de o Supremo Tribunal Federal (STF) solicitar mandados de busca e apreensão em endereços ligados a empresários bolsonaristas que escreveram mensagens que citam golpes, o presidente Jair Bolsonaro (PL) buscou minimizar o episódio e até acusou o caso de ser uma mentira. “Que empresários? Qual é o nome deles? Chega de fake news”, declarou o chefe do Poder Executivo na quinta-feira, 18, durante evento em São José dos Campos (SP).

Na sexta-feira, 19, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, determinou que a Polícia Federal realizasse a operação nas residências dos empresários. A ordem foi cumprida ontem. A mensagens, reveladas pela coluna do jornalista Guilherme Amado, no site Metrópoles, foram feitas em um grupo de WhatsApp. Um dos empresários chegou a falar que preferia um “golpe” em vez da volta do PT ao governo. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está em primeiro lugar em todas as pesquisas de intenção de voto para a eleição presidencial deste ano.

Moraes é relator do inquérito que apura atos antidemocráticos. O ministro pediu a atuação da PF para saber se os empresários financiaram atos contra a democracia. O ministro já foi alvo de diversos ataques de bolsonaristas e aliados. O próprio presidente já chegou a chamá-lo de “canalha”.

O vice-presidente Hamilton Mourão (Republicanos-RS), candidato ao Senado, criticou ontem, a operação contra empresários que escreveram as mensagens. “A meu ver, uma atitude arbitrária e que institui o crime de pensamento. A defesa da Democracia não pode significar a morte da mesma”, afirmou o general ao Portal Estadão.

Empresários negam defesa de ruptura

Advogados de defesa e empresários se defenderam das acusações. Alberto Toron e Luiz Otávio Pacífico, que defendem o empreiteiro Meyer Joseph Nigri, afirmaram que o empresário, “mesmo sem ter tido acesso aos autos do inquérito, como era seu direito, concordou em ser ouvido” ontem, “para colaborar com as investigações”.

“(Nigri) rechaçou qualquer envolvimento com associação criminosa ou práticas que visam à abdicação do estado democrático ou preconizam golpe de Estado. Ao contrário, reafirmou sua firme crença na democracia e seu respeito incondicional aos Poderes constituídos da República”, disseram os advogados, em nota.

Já Daniel Maia, advogado de Afrânio Barreira Filho, disse que a operação de ontem estava “fundada em denúncias absolutamente falsas, que visam perseguir pessoalmente o empresário Afrânio Barreira e outros no País”.

Luciano Hang disse estar “tranquilo”. “Desde que me tornei ativista político, prego a democracia e a liberdade de pensamento e de expressão, para que tenhamos um País mais justo e livre para todos os brasileiros”, disse o dono da Havan.

Para Rodrigo Pacheco, difundir golpe ‘é traição’

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, rechaçou ontem ataques contra a democracia ao comentar a operação da Polícia Federal contra empresários bolsonaristas que defenderam golpe, em grupos de mensagens, caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva seja eleito em outubro.

“Qualquer pessoa, independente de ser empresário, conhecido ou não, que prega retrocesso democrático, atos institucionais, volta da ditadura, está redondamente equivocada. É um desserviço ao País. É uma traição à Pátria e isso, obviamente, tem que ser rechaçado e repudiado com toda veemência pelas instituições”, disse o senador ao chegar à Casa.

Segundo ele, “arroubos precisam ser repudiados”, mas não acredita que eles necessariamente gerem riscos à democracia. “A nossa democracia está tão assimilada pelas instituições e pela sociedade, que considero esses arroubos, que precisam ser repudiados, mas eles de fato, não fazem gerar um risco concreto à nossa democracia. São manifestações infelizes que devem ser rechaçadas”, disse Pacheco.

PF cumpriu busca e apreensão

A Polícia Federal (PF) cumpriu ontem mandados de busca e apreensão em endereços ligados a oito empresários bolsonaristas. Os alvos foram: Afrânio Barreira Filho, do restaurante Coco Bambu; Ivan Wrobel, da W3 Engenharia; José Isaac Peres, do grupo Multiplan; José Koury, dono do shopping Barra World; Luciano Hang, da rede de lojas Havan; Luiz André Tissot, da Sierra Móveis; Marco Aurélio Raymundo, da Mormaii; e Meyer Joseph Nigri, da Tecnisa.

A operação foi aberta por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal federal (STF). O Portal do Estadão apurou que a ordem foi expedida depois que o portal Metrópoles revelou mensagens golpistas em um grupo de WhatsApp dos empresários.

Os mandados estão sendo cumpridos em dez endereços residenciais e profissionais no Rio de Janeiro, Ceará, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e São Paulo.

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