Bilionários criam foguetes com foco no turismo em Marte

Se a corrida à Lua nos anos 1960 foi marcada pela competição entre nações, a disputa para chegar a Marte se tornou um jogo de egos bilionários. Ao lançar um carro ao espaço a bordo do superfoguete Falcon Heavy, o sul-africano Elon Musk realizou mais que uma jogada de marketing: mostrou ao mundo que a sua SpaceX está um passo à frente.

A Blue Origin, bancada por Jeff Bezos, dono da Amazon e de uma das maiores fortunas do planeta, planeja o teste do seu foguete orbital New Glenn apenas para 2020. Correndo por fora, o britânico Richard Branson pretende ocupar o segmento de turismo espacial com a Virgin Galactic, segundo informações de O Globo.

— Eu não sou apaixonado por Marte como Elon é. Meu amor pelo espaço é sobre o quanto podemos fazer pelas pessoas aqui na Terra — declarou Branson num fórum em Helsinki, na Finlândia, no fim do ano passado, apontando o seu favorito para o primeiro desembarque no planea vermelho. — Chegar a Marte é um desafio incrível e eu acredito que Elon Musk vai chegar lá primeiro. Ele é o mais interessado em grandes foguetes para longas distâncias.

Os três empresários que fizeram bilhões no setor de tecnologia levaram a lógica das startups para a exploração espacial, revolucionando uma indústria que até o início do século era monopolizada por agências estatais. O primeiro passo foi reduzir drasticamente os custos com o uso de foguetes reutilizáveis. Bezos foi o primeiro, ao lançar e pousar o New Shepard em novembro de 2015. No mês seguinte, a SpaceX recuperou pela primeira vez um foguete Falcon 9. Segundo Musk, as partes reutilizáveis representam 70% do custo de um lançamento.

— A SpaceX simplificou o sistema de produção, criou um ritmo de fabricar e testar enquanto os concorrentes ficam preocupados demais calculando os riscos — avalia Nilton Rennó, diretor do programa de mestrado em engenharia de programação espacial da Universidade de Michigan. — O pessoal da Nasa e das rivais diz que isso é arriscado demais. Por sua vez, Elon Musk diz, com razão, que até agora deu tudo certo.

“APENAS” US$ 90 MILHÕES

Cada voo do Falcon Heavy, com capacidade para levar 63,8 toneladas de carga até a órbita terrestre baixa, custa entre US$ 90 milhões (equivalente a R$ 296 milhões) e US$ 160 milhões (R$526 milhões). Atualmente, a principal concorrente da SpaceX é a United Launch Aliance, um empreendimento conjunto da Lockheed Martin com a Boeing, com o foguete descartável Delta IV, com capacidade de 28,8 toneladas a um custo mínimo de US$ 350 milhões.

As cifras parecem altas, mas são nada comparadas ao custo do descartável Space Launch System (SLS), em desenvolvimento pela Nasa. O veículo de grande porte, como o Falcon Heavy, está sendo projetado para levar ao espaço até 130 toneladas, mas com custo de US$ 1 bilhão por lançamento. Após vários adiamentos, o primeiro voo está previsto para 2020. Até lá, a SpaceX pretende já ter lançado seu próximo foguete, o Big Falcon Rocket (com capacidade de 150 toneladas) e a Blue Origin, o New Glenn (45 toneladas).

A própria Nasa se tornou cliente frequente da SpaceX. O Falcon 9, modelo anterior ao Falcon Heavy, já realizou 17 missões para a agência americana, sobretudo para reabastecimento da Estação Espacial Internacional. O Departamento de Defesa também já utilizou o foguete reutilizável. Além disso, a companhia presta serviços para o setor privado, principalmente no lançamento de satélites para empresas de telecomunicações.

Mesmo antes do primeiro lançamento, a Blue Origin já tem clientes para o New Glenn, todos do setor privado. Mas esse não é o único objetivo da empresa do fundador da Amazon: ela pretende explorar o setor de turismo espacial. A cápsula que está sendo desenvolvida tem capacidade para seis passageiros, para um voo com duração entre 10 e 15 minutos, antes do retorno para a Terra.

Este é o mesmo foco da Virgin Galactic, mas diferente de Musk e Bezos, Branson aposta numa espaçonave lançada a partir de um avião, não por foguetes verticais. A SpaceShipTwo retomou os voos de teste em 2016, após longa pausa forçada por um acidente em 2014, que resultou na morte de um dos pilotos. Em outubro passado, Branson prometeu que ele mesmo iria ao espaço dentro de seis meses.

Elon Musk é mais ambicioso. Ele comemorou o trajeto traçado pelo carro que seu foguete lançou: “Sucesso. Excedeu a órbita de Marte e continuou indo em direção ao Cinturão de Asteroides”. O objetivo estava claro desde o início. As caixas de som da plataforma de lançamento tocaram a música “Life on Mars” (“Vida em Marte”), de David Bowie, quando foi confirmado o sucesso da missão.

O plano da SpaceX é utilizar o Big Falcon Rocket para criar uma rota contínua entre a Terra e Marte, reduzindo os custos de uma possível colonização. O plano prevê que em 2022 serão enviadas duas missões ao planeta vermelho, com suprimentos e equipamentos, seguidas por duas missões tripuladas em 2024.

— Queremos uma nova corrida espacial, corridas são excitantes — disse Musk na coletiva após o lançamento do Falcon Heavy.

PROVOCAÇÕES ENTRE RIVAIS

Bezos desejou sorte a Musk no dia anterior ao lançamento e se juntou ao coro de celebrações quando a missão foi concluída. Mas nem sempre o clima foi amistoso entre os dois. Em dezembro de 2015, quando a SpaceX conseguiu pela primeira vez recuperar um foguete, Bezos tuitou para seu concorrente: “Bem-vindo ao clube”, mensagem vista como uma provocação.

— Vamos entrar em uma fase quase de ficção científica — prevê Otavio Cupertino, tecnologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, ressaltando que os empresários podem estar se propondo a mais do que conseguem entregar de fato. — Vamos assistir novamente a uma corrida espacial, dessa vez pelo viés científico e de exploração.

Pedro Luiz Kaled, engenheiro da Agência Espacial Brasileira, avalia que a concorrência é bem-vinda para o desenvolvimento do setor:

— Significa que os custos de operação devem cair. Caminhamos para um mercado competitivo e rico, com alta probabilidade de novas iniciativas surgirem em pouco tempo.

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