BNDES pagou indevidamente 20% mais por ações da JBS, diz TCU

Luciano Coutinho, ex-presidente do BNDES, em seminário realizado em 2014

TCU quer que Batista, Mantega, Sandri, Coutinho e demais implicados se justifiquem ou sejam obrigados a pagar pelo prejuízo

Auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União) concluiu que o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) pagou indevidamente 20% a mais por ações da JBS na operação para apoiar a compra do frigorífico National Beef Packing e da divisão de carnes da Smithfield Foods, ambos nos Estados Unidos.

O relatório sobre o caso, obtido pela Folha, aponta “dano ao erário” de ao menos R$ 303 milhões no negócio, feito em 2008. O julgamento do processo está previsto para esta quarta-feira (18).

Conforme a investigação do tribunal, o banco teve uma perda de R$ 285,6 milhões ao adquirir a participação na empresa dos irmãos Joesley e Wesley Batista. Além disso, deixou de obter R$ 18,3 milhões em dividendos, pois poderia ter comprado um lote maior de ações, pagando o “preço justo”. Os valores estão atualizados a julho.

O relatório foi concluído no fim de setembro e distribuído na segunda-feira (16) aos ministros do TCU. A investigação propõe que a corte responsabilize Joesley, o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega e o empresário Victor Garcia Sandri, apontado como amigo do petista, pelo suposto prejuízo. As informações são de FÁBIO FABRINI, Folha de São Paulo.

O relator do caso, ministro Augusto Sherman, não havia distribuído seu voto a respeito até a noite de terça (17).

Os auditores concluíram, com base na delação da JBS, que Joesley, Mantega e Sandri se associaram de forma criminosa para conceder vantagens à empresa.

Em sua delação, Joesley afirmou ter pago propinas a Mantega, por meio de Sandri, para conseguir aportes bilionários do BNDES, mas nega que as transações tenham gerado perdas à instituição.

A auditoria também sugere a responsabilização do ex-presidente do banco, Luciano Coutinho, além de outros ex-dirigentes da instituição, por atuarem de forma “negligente” e “não diligente” ao analisar e aprovar o negócio.

NEGÓCIO

O BNDESPar –braço do banco para a aquisição de participações– investiu o equivalente a R$ 2,6 bilhões, em valores atuais, para adquirir ações da JBS. O aporte visou capitalizar o grupo para a compra das concorrentes. Com a operação, o banco passou a ser dono de uma fatia maior da empresa.

O negócio fez parte da política de “campeões nacionais” dos governos do PT. Segundo o TCU, com base em dados do próprio BNDES, entre 2005 e 2014, o banco repassou mais de R$ 10 bilhões para a JBS.

Segundo a auditoria, a operação para aquisição das empresas foi aprovada em tempo “exíguo”, com base em pareceres “precários”, que levavam em conta principalmente informações da JBS e não pesavam adequadamente riscos e vantagens.

O BNDES aceitou pagar R$ 7,07 por ação, ao tirar a média do valor negociado em bolsa nos 120 pregões anteriores à data do negócio. O critério foi prejudicial ao banco.

O padrão do BNDES é fazer a média de 30, 60 ou 90 pregões. Na ocasião, as ações da JBS estavam em queda. Quanto mais dilatado o prazo, maior seria o preço final da ação.

A auditoria diz que o cálculo da perda é conservador, pois considerou a média de 90 pregões para achar o “preço justo” da ação (R$ 5,90).

Se fizesse a média de 30 ou 60 pregões, o rombo no negócio, atualizado, chegaria a R$ 728,3 milhões.

A compra da National Beef não se concretizou, pois autoridades americanas antitruste levantaram barreiras ao negócio. Para o tribunal, com isso, a JBS teve outro favorecimento: ficar com recursos do banco em caixa, a custo zero. “Não é objetivo social do BNDES prover caixa gratuito para empresas privadas”, diz trecho do relatório.

A auditoria ainda aponta “desvio de finalidade”, já que o recurso foi usada depois na compra de “empresa estranha” à operação –a australiana Tasman. O TCU sustenta que o BNDES não comprovou os benefícios da operação.

O órgão propõe que Batista, Mantega, Sandri, Coutinho e demais implicados se justifiquem ou sejam obrigados a pagar pelo prejuízo.

O TCU avalia quatro grandes negócios do BNDES com a JBS. Em julho, havia indicado perdas de R$ 126 milhões na compra Swift, em 2007.

OUTRO LADO

A JBS afirmou que todos os aportes do BNDES “seguiram estritamente a legislação” e as “práticas de mercado” e foram rentáveis para o banco. Informou ainda que, no primeiro negócio, em 2007, a instituição pagou R$ 8,15 por ação ao adquirir 12,9% da companhia. “Em 2015, o BNDESPar vendeu parte das ações a cerca de R$ 15 cada”, exemplificou.

A empresa disse que o banco “recebeu dividendos” e continuará a receber.

O BNDES informou que os investimentos no setor de carnes estavam “alinhados com a política governamental vigente”. O banco disse que, na sociedade com a JBS, recebeu R$ 5 bilhões, fruto de venda de ações, dividendos e prêmios.

O ex-ministro Guido Mantega e o empresário Victor Sandri não se pronunciaram. Luciano Coutinho disse que o valor das ações foi definido pela empresa, como “prevê a legislação”. “Os R$ 7,07 foram considerados um preço atrativo, abaixo de estimativas da época feitas feitas pela área técnica do BNDES e por instituições financeiras de primeira linha.” A operação, segundo Coutinho, deu “retorno expressivo” ao BNDES e resultados para o Brasil.

Ele afirmou que os prazos de análise e aprovação dos negócios foram similares aos de outras operações e que não houve desvio de finalidade.

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