Empresário inglês foragido da Justiça Federal do RN é preso nos Emirados Árabes

Anthony Armstrong, ex-presidente do Alecrim (arquivo) — Foto: Divulgação/Alecrim FC

Com mandado de prisão expedido pela Justiça Federal do Rio Grande do Norte e foragido desde março, o empresário inglês Anthony Armstrong Emery foi preso pela Interpol nos Emirados Árabes, na semana passada. A informação foi confirmada pela Justiça Federal. O homem foi detido na terça-feira (27) e o processo para pedido de extradição já foi autorizado.

O ex-presidente do Alecrim Futebol Clube e mais sete pessoas foram denunciados por envolvimento em um esquema de lavagem de dinheiro. De acordo com o MPF, o grupo desviou pelo menos R$ 75 milhões de quase dois mil investidores que achavam que estavam aplicando dinheiro em construção de moradias do programa Minha Casa Minha Vida no Rio Grande do Norte, entre 2012 e 2014.

A informação da prisão, pela Interpol, foi juntada ao processo na quinta-feira (29) da semana passada e o Ministério Público Federal pediu a extradição do empresário. Em sua decisão sobre o assunto, o juiz da14ª Vara Federal, Francisco Eduardo Guimarães Farias, autorizou a adoção das providências necessárias para extradição junto ao Ministério da Justiça.

O magistrado ainda solicitou auxílio da Secretaria de Cooperação Internacional do Ministério Público Federal para realizar a tradução de todos os documentos necessários à formalização do procedimento para o idioma Árabe.

“Uma vez ultimados os trabalhos de tradução, deverá a Secretaria enviar os documentos pertinentes ao Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional da Secretaria Nacional de Justiça (DRCI/MJ), por meio eletrônico, com a máxima urgência, dando-se prosseguimento ao pedido de extradição de Anthony Jon Domingo Armstrong Emery”, diz a decisão.

Godfather

Armstrong ganhou destaque em Natal, ao presidir e o Alecrim Futebol Clube. Segundo a denúncia do MPF, através do chamado Grupo Ecohouse, que patrocinava o time, o empresário inglês e sua enteada e principal sócia prometiam aos investidores ganhos de 20% por ano. A rentabilidade viria da construção e venda de moradias populares dentro do programa “Minha Casa, Minha Vida”, no Rio Grande do Norte.

No entanto, segundo a denúncia, as obras não eram concluídas e algumas sequer foram iniciadas, o grupo não possuía convênio com o programa federal (embora divulgasse que era a única empresa inglesa a deter o convênio) e o dinheiro de quem investiu nunca foi devolvido.

Ainda de acordo com o MPF, além de Armstrong e da enteada, foi denunciado um funcionário da Caixa Econômica Federal. O servidor teria atestado ilegalmente, com base em informações falsas, que o Ecohouse tinha contrato com o programa do Governo Federal. O banco esclareceu que não costuma emitir esse tipo de documentação e que o funcionário não tinha o direito de fazê-lo.

Também foram alvos de denúncia cinco contadores que assinavam como “profissionais independentes” as declarações (107, ao todo) que atestavam o suposto andamento das obras. Os procuradores alegam que eles nunca nem mesmo visitaram os canteiros e as declarações falsas ajudavam a ludibriar os investidores.

Prisão

Em março, o MPF pediu prisão preventiva de Armstrong e de sua enteada. O pedido chegou a ser feito no curso da investigação, pela Polícia Federal, porém a Justiça entendeu na época que seriam suficientes a apreensão dos passaportes e a proibição de os dois saírem do país.

Mesmo assim, eles fugiram do Brasil e, depois de passar pelo Principado de Mônaco e pelos Emirados Árabes Unidos, estavam em local desconhecido. “Provavelmente usufruindo dos recursos que amealharam criminosamente”, diz o MPF.

A denúncia é fruto da chamada Operação Godfather, deflagrada em 2014, cujas investigações tiveram início a partir de informações do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). A nomenclatura faz alusão ao título em inglês dos famosos livros e filmes cujo nome em português, “O Poderoso Chefão”, se tornou apelido de Anthony Armstrong no RN.

Prejuízos

O MPF detalha que o esquema prejudicou até 1.500 investidores de Singapura e aproximadamente 350 do Reino Unido. Embora eles tenham passado pelas contas do Grupo Ecohouse R$ 75 milhões em dois anos e meio, há relatos de prejuízos ainda maiores. Uma advogada que representa 400 clientes de Singapura calcula em R$ 64 milhões o prejuízo deles.

Já no Reino Unido, onde Armstrong foi condenado em março de 2019 pela Suprema Corte Britânica, o prejuízo estimado no processo (em relação aos 350 investidores locais) foi de aproximadamente R$ 120 milhões. Por lá, cada interessado investia 23 mil libras esterlinas, enquanto em Singapura cada cota era vendida por 46 mil dólares de Singapura.

O esquema

Segundo o MPF, o dinheiro era captado através da Ecohouse Brasil Construções (uma das empresas do grupo e que atuava ilegalmente como instituição financeira) e desviado para gastos pessoais dos dois principais envolvidos, além de investimentos em outras empresas do grupo. Pelo menos R$ 4 milhões foram gastos com o Alecrim Futebol Clube, do qual Armstrong era presidente. Sem contar despesas com empresas particulares dos dois líderes do esquema.

“O estrangeiro e a enteada curtiam uma vida de luxo, viagens e compras, até como forma de transmitir aos investidores a ‘saúde financeira’ de seus negócios”, alega o Ministério Público Federal.

Ainda segundo o MPF, algumas poucas obras eram tocadas para enganar os clientes e, quando esses investidores vinham visitá-las, um “rodízio de operários” era feito para dar a impressão de que estavam a em andamento normal.

“No caso do Alecrim, os valores empregados não foram registrados na contabilidade do clube, que ao final o empresário abandonou, deixando como legado uma série de ações trabalhistas e uma mancha na reputação do time”, afirmam os procuradores.

O MPF informou que cerca de R$ 1 milhão também foi gasto na promoção da Copa Ecohouse, que reuniu 16 clubes em 2013, incluindo alguns dos maiores do Nordeste e até mesmo o Fluminense, do Rio de Janeiro. Todo esse investimento visava à divulgação da imagem de Armstrong como um “grande empresário”.

 

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