Estudo da USP relaciona celular a bactérias resistentes à limpeza em UTIs

Um estudo realizado no Hospital das Clínicas da USP (Universidade de São Paulo) de Ribeirão Preto encontrou bactérias resistentes à limpeza diária dentro das UTIs (Unidade de Terapia Intensiva) adulta e neonatal da instituição. Uma das fontes de contaminação, segundo a pesquisa, é o uso do celular nesses locais.

Os resultados do estudo foram publicados em agosto na revista inglesa “Frontiers in Public Health”, especializada em saúde.

O trabalho foi realizado em colaboração com a CCIH (Comissão de Controle de Infecção) do próprio Hospital das Clínicas. Segundo a professora María Eugenia Guazzaroni, responsável pela coordenação da pesquisa, um dos interesses do hospital era “conscientizar os próprios médicos e enfermeiras, que às vezes não respeitavam os protocolos que devem ser seguidos na UTI”.

“Dentro da UTI, você não pode utilizar o celular. E isso não era completamente respeitado pela equipe médica, sejam médicos ou enfermeiras”, diz a pesquisadora.

Para o estudo, foram coletadas amostras de superfícies como prontuários médicos, bombas de infusão e colchões, antes e depois da limpeza diária realizada na UTI. Também foram analisados equipamentos como celulares, monitores e teclados presentes no local.

“Utilizamos tudo o que estava próximo ao paciente e também o que era de uso frequente do pessoal médico dentro das UTIs”, explica a professora.

A partir de uma análise de sequenciamento genético de última geração, foi possível identificar os tipos de bactérias presentes no local. Entre esses microrganismos, segundo Guazzaroni, foram encontradas bactérias potencialmente patogênicas —com potencial para causar doenças e infecções.

“Alguns dos equipamentos médicos que tinham mais manuseio estavam enriquecidos em bactérias de gêneros normalmente associados com pele, com cabelo humano. Mas também vimos que muitos desses equipamentos tinham gêneros patogênicos”, afirma.

A relação dessas bactérias com as infecções dos pacientes internados na UTI ainda será estudada. A pesquisadora destaca, no entanto, que uma bactéria que pode ser inofensiva a uma pessoa saudável pode trazer riscos aos pacientes de UTIs que estejam com o sistema imunológico mais fragilizado.

“Crianças ou adultos com o sistema imune comprometido, internados lá dentro, são muito vulneráveis. E uma bactéria que não é patogênica [para uma pessoa saudável] pode ser patogênica para eles”, afirma.

Rosana Richtmann, infectologista do Instituto Emílio Ribas, ressalta que a transmissão de bactérias é feita primordialmente pela falta de higienização das mãos. Segundo ela, é esse descuido que pode fazer com que o celular —ou qualquer outro equipamento ao alcance das mãos— funcione como uma espécie de ponte para a contaminação.

“Ao examinar um paciente, não lavar as minhas mãos, pegar o meu celular para falar com alguém e examinar o próximo paciente, eu não só estou transmitindo de um paciente para outro, como estou contaminando o meu celular”, diz.

“O mais importante dessa pesquisa é pensar: quais são as medidas que os hospitais ou qualquer um de nós faz em relação ao celular, em termos de limpeza? A gente não tem rotina de limpeza do celular, nenhum hospital tem”, afirma a infectologista.

Produtos químicos e limpeza

A pesquisa aponta, ainda, para o risco do uso de um mesmo produto químico para a limpeza diária realizada nas UTIs.

“O que vimos foi que, apesar de a limpeza ser feita, ela sempre é feita com o mesmo produto químico. Isso pode levar as bactérias a adquirir rapidamente resistência a esse produto”, diz Guazzaroni. Segundo ela, um eventual revezamento de produtos químicos “minimizaria” os riscos representados por essas bactérias.

Richtmann, por outro lado, diz que a resistência bacteriana é “muito evidente para os antibióticos”, mas que o mesmo fenômeno não é visto para antissépticos e desinfetantes “na mesma velocidade”.

“Sou completamente a favor de uma boa campanha de conscientização de higiene das mãos. Essa pesquisa é muito importante para a gente entender que as nossas mãos é que carregam as bactérias pelo contato com o celular, que pode ser uma fonte de infecção”, afirma a infectologista.

Guazzaroni diz esperar que os resultados encontrados pela pesquisa sejam utilizados para diminuir a quantidade de bactérias patogênicas presentes na UTI.

“Aqui, os protocolos de entrada de visitantes na UTI, de manipulação pela equipe médica e de respeito às regras, como o uso do celular, ainda são muito relaxados.”

*Portal UOL

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.