Procurador-geral da República entra com Ação Direta de Inconstitucionalidade contra emenda à Constituição de Minas que desobriga igrejas alegando ‘risco injustificado aos próprios adeptos das crenças praticadas nesses edifícios’
Fausto Macedo e Julia Affonso – O Estado de São Paulo
A dispensa de alvará e licenciamento para templos religiosos é inconstitucional. Para o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, “cabe ao estado regular e limitar o exercício de atividades privadas, quando isso for necessário para proteção do interesse público”. Com esse entendimento, Janot propôs ao Supremo Tribunal Federal ação direta de inconstitucionalidade (ADI 5696) contra a Emenda Constitucional 44/2000 à Constituição do Estado de Minas Gerais, que autoriza a dispensa.
As informações foram divulgadas pela Assessoria de Comunicação Estratégica da Procuradoria.
Na ação, Janot destaca que suspender a prerrogativa pública, no caso de templos religiosos, “ameaça a segurança dos frequentadores desses locais e provoca ocupação desordenada do território do município”.
Segundo ele, a atividade religiosa ‘não se diferencia de outras atividades privadas para fins de controle sanitário e ambiental’ e acrescenta que os locais em que se realiza, os templos, não estão imunes ao poder de polícia administrativa.
O procurador-geral argumenta que a suspensão do poder de polícia administrativa no caso das licenças para funcionamento de templos religiosos não é definição que garanta liberdades ou proteja o pluralismo religioso, ‘ao contrário, imuniza os templos religiosos de obrigação legal aplicável à generalidade das pessoas físicas e jurídicas e privilegia atividade religiosa à custa da segurança das pessoas’.
Para Janot, ‘segurança, tanto de edificações quanto de pessoas, constitui requisito para o livre desenvolvimento da atividade religiosa nos templos’.
O procurador ainda destaca que já houve mais de um incidente em templos religiosos que não cumpriram práticas de segurança predial e sanitária. “A norma constitucional estadual inserida pela emenda impugnada impede de maneira inaceitável o exercício pleno e legítimo do poder de polícia, com o que põe em risco injustificado os próprios adeptos das crenças praticadas nesses edifícios”, assinala.
Janot também cita ‘afronta’ ao princípio da laicidade do Estado – artigo 19, inciso I, da Constituição. De acordo com ele, a norma em análise ‘instituiu verdadeiro privilégio a templos religiosos, ao eximi-los de obrigações impostas pelo poder de polícia administrativa’.
Competência. De acordo com a ação, ao eximir de licenciamento urbanístico municipal atividades religiosas, a emenda constitucional dispôs sobre matéria de direito urbanístico e de interesse local, tema que a Constituição da República reserva aos municípios.
O procurador-geral da República observa que o artigo 30, inciso VIII, da Constituição determina que ‘compete aos municípios promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle de uso, parcelamento e ocupação do solo urbano’.
Já o artigo 182 da Constituição define que a política de desenvolvimento urbano é executada pelo poder público municipal, tendo como objetivos o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e o bem-estar de seus habitantes.
“Apenas os municípios possuem autorização constitucional para regulação ‘concreta e dinâmica’ do espaço urbano”, aponta. Para Janot, a Emenda Constitucional 44/2000 de Minas Gerais, ao dispor sobre competências privativas do município, inseriu indevidamente regra específica relativa a licenciamento e instalação de templos religiosos, a qual não apenas viola a autonomia desses entes, como afronta o princípio da laicidade do estado.