J&F diz que pagou propina de R$ 800 mil para captar R$ 15 bi na Caixa e BNDES

As empresas do grupo J&F – holding controladora da JBS – receberam cerca de R$ 15,5 bilhões em empréstimos e aportes de capital feitos pela Caixa Econômica Federal e pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) mediante pagamento de propina a políticos, segundo delatores da empresa. De acordo com o empresário Joesley Batista, os repasses ilícitos tinham como destinatários o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB), o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega (PT) e o atual ministro da Indústria e Comércio, Marcos Pereira (PRB).

Foram R$ 5,5 bilhões liberados pela Caixa; R$ 2 bilhões pelo BNDES; e US$ 3,58 bilhões pelo BNDESPar – ou cerca de R$ 8 bilhões pela conversão da moeda feita pelos investigadores da Operação Bullish, que justamente apurava os aportes do BNDES na JBS. As propinas totalizaram, segundo os relatos de Joesley, cerca de R$ 800 milhões, na cotação de sexta-feira, 19.

Boa parte dos acertos foi feita por meio de intermediários, que recebiam comissões, disse o empresário. Na Caixa, Lúcio Funaro seria o responsável pela propina de Cunha, atualmente preso pela Lava Jato em Curitiba; o atual vice-presidente do banco, Antonio Carlos Ferreira, pediu pagamentos em nome de Pereira, segundo a delação.

Joesley afirmou que Victor Sandri agiu em nome de Mantega nos aportes feitos pelo BNDES na JBS entre 2005 e 2008. Depois, os acertos foram negociados diretamente com o ex-ministro dos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.

Os casos relatados por Joesley se estenderam ao longo de dez anos. De acordo com ele, os últimos pagamentos foram feitos em função do empréstimo de R$ 2,7 bilhões que a Caixa deu para a J&F comprar a Alpargatas, dona da marca Havaianas e que pertencia à Camargo Corrêa. A operação ocorreu em 2015 quando a Lava Jato já estava em andamento.

A Caixa financiou 100% da aquisição, algo inusual para um banco. Havia interessados na Alpargatas, participando oficialmente da concorrência. Entretanto, foram informados de que nem sequer poderiam fazer propostas para comprar a empresa. A J&F comprou a Alpargatas à vista, sem fazer uma auditoria.

Esse empréstimo para a compra da Alpargatas rendeu R$ 6 milhões em propina para o ministro de Michel Temer, segundo Joesley. O pedido foi feito por Ferreira, o vice-presidente da Caixa. De acordo com Joesley, somente R$ 4 milhões foram efetivamente entregues e a última parcela foi suspensa, já em função das investigações que envolviam as empresas do grupo.

Em abril deste ano, Joesley foi informado por Ferreira de que as linhas de crédito da Caixa para o grupo estavam sendo revistas e não haveria renovação por causa de um suposto “desenquadramento técnico” do banco nos empréstimos ao grupo. O banco não comentou o caso específico e informou que abriu investigação interna para apurar possíveis irregularidades. O vice-presidente não atende ao telefone, segundo a assessoria de imprensa.

FI-FGTS. Além de Ferreira, também Funaro prestou assessoria no negócio da Alpargatas, que envolveu pagamentos de R$ 80 milhões para o operador, segundo Joesley. Desde 2011, Funaro presta serviços à J&F, de acordo com o delator, basicamente para intermediar empréstimos da Caixa.

O primeiro caso envolvendo Funaro foi a liberação de R$ 940 milhões do FI-FGTS para a Eldorado Celulose. Joesley relatou que o primeiro contato foi feito nessa época e que o operador já chegou ao seu escritório com conhecimento do pleito da Eldorado. O empresário contou que em um primeiro momento não quis pagar pelos serviços, até porque no FI-FGTS existe um conselho formado por 12 pessoas que aprovam ou não um financiamento. Mas esse empréstimo teria travado e então Joesley decidiu pagar cerca de R$ 33 milhões. Depois disso, outros de R$ 1,95 bilhão de empréstimos em linhas tradicionais, como de financiamento à exportação foram feitos da mesma forma.

Burocracia. Joesley afirmou aos procuradores que os financiamentos em geral eram feitos de forma técnica, com juros de mercado e exigência de garantias. A questão é que, se não houvesse o pagamento de propina, os empréstimos não eram liberados por burocracias.

O empresário disse que no BNDES a equipe técnica de sua empresa não tinha a menor ideia de seu relacionamento com Mantega, que seria a pessoa influente para a liberação dos empréstimos e aportes do banco. Mesmo Luciano Coutinho, segundo Joesley, que era presidente do banco, mostrava desconhecer os termos da relação com o ex-ministro petista.

O BNDES foi o grande financiador da expansão da JBS, que se tornou a maior processadora de carne do mundo. A empresa faturava R$ 4 bilhões em 2007 e fechou o ano passado com R$ 170 bilhões. Entre 2006 e 2008, o banco liberou US$ 1,58 bilhão quando Mantega usava o intermediário Sandri. Foram pagos a ele US$ 70 milhões. Joesley conto que, já na fase em que a relação era direta com Mantega, foram liberados US$ 2 bilhões para a JBS e R$ 2 bilhões para a Eldorado, gerando pagamentos de US$ 150 milhões.

Os advogados de Funaro, Cunha e Mantega não comentaram.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.