Ministros do STJ que vão julgar recurso de Lula já votaram a favor de prisão em segunda

Em julgamento ocorrido em março do ano passado, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu por unanimidade que é possível prender alguém após condenação em segunda instância. Por outro lado, destacou que, em situações excepcionais, essa regra pode ser flexibilizada, permitindo que o condenado recorra em liberdade.

Nesta terça-feira, o mesmo colegiado vai julgar um pedido da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já condenado em primeira e segunda instância. É um habeas corpus preventivo — uma vez que ainda não há ordem de prisão contra Lula — para permitir que ele continue em liberdade enquanto recorre da condenação nos tribunais superiores.

Reservadamente, um ministro do tribunal avaliou que a Quinta Turma vai manter por unanimidade o mesmo entendimento, ou seja, vai negar o pedido de Lula. Segundo ele, o STJ é uma corte técnica que segue os precedentes. Caso o tribunal confirme a expectativa, isso não significa que Lula será preso logo. A decisão de expedir ordem de prisão será tomada somente depois que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) concluir o julgamento de um recurso apresentado pela defesa contra a condenação. E, no momento em que finalmente houver a prisão, nada impede a apresentação de novo pedido de liberdade ao STJ. As informações s]ao de ANDRÉ DE SOUZA / CAROLINA BRÍGIDO – O Globo.

Em março do ano passado, ao julgar um habeas corpus de um condenado em segunda instância de São Paulo, o relator, ministro Felix Fischer, negou o pedido. Ele lembrou que, em 2016, a mais alta corte do país, o Supremo Tribunal Federal (STF), deu uma “guinada” e mudou o entendimento vigente até então, de que era preciso esgotar todos os recursos para prender alguém. A atual orientação é de que é possível prender após a segunda instância.

Os demais ministros da Quinta Turma — Jorge Mussi, Reynaldo Soares da Fonseca, Ribeiro Dantas e Joel Ilan Paciornik — concordaram com ele. Em abril, os cinco ministros rejeitaram novo recursos nesse mesmo processo. Fischer também é o relator do habeas corpus de Lula e dos demais processos da Lava-Jato no STJ.

“De maneira que, sem nenhum arranhão ao princípio da não-culpabilidade ou da presunção de inocência, a partir da decisão condenatória do Tribunal de Justiça ou do Tribunal Regional Federal, penso, pode-se partir para a execução da pena”, disse Fischer na época, citando outros julgamentos do próprio STJ já seguindo a nova orientação do STF.

Ele fez uma ressalva: o julgamento do STF em 2016 não afasta a possibilidade de conceder ao condenado em segunda instância uma decisão favorável. Mas isso é a exceção, e não a regra.

“Assim, a excepcionalidade da situação é que ditará a possibilidade de suspensão dos efeitos do julgado, sendo, contudo, a sua produção, à guisa de execução provisória, a regra decorrente do julgamento condenatório proferido pelo segundo grau de jurisdição, como sucede na espécie”, anotou Fischer em seu voto em março de 2017.

Em julho do ano passado, o juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, responsável pelos processos da Operação Lava-Jato, condenou Lula a nove anos e meio de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá. Em janeiro, o TRF4, que integra a Justiça Federal de segunda instância, confirmou a condenação e aumentou a pena para 12 anos e um mês. Mas falta ainda analisar os embargos de declaração, um tipo de recurso que serve para esclarecer pontos do julgamento, embora dificilmente mude a situação do réu.

O habeas corpus preventivo no STJ foi apresentado pela defesa de Lula em janeiro de 2018, quando a corte estava de recesso. Assim, o pedido de liminar foi julgado não pelo relator, mas pelo vice-presidente do STJ, ministro Humberto Martins. Ele negou a solicitação dos advogados do ex-presidente.

Segundo o ministro, como Lula ainda tinha direito a recorrer ao próprio TRF, não havia risco imediato de prisão. Agora, o habeas corpus será examinado pelos cinco ministros da Quinta Turma. A partir das 13h, a sessão será transmitida ao vivo pelo YouTube, uma prática pouco usual para o STJ.

O ministro Felix Fischer é conhecido por ser rigoroso em processos penais, especialmente em casos da Lava-Jato, dos quais é relator. No início, ele vai ler o relatório, uma espécie de resumo do que há no processo. Em seguida, um procurador da República vai fazer a sustentação oral. Em parecer, a Procuradoria-Geral da República (PGR) já recomendou que o colegiado negue o pedido, tomando por base o julgamento de 2016 do STF.

O advogado de Lula, Sepúlveda Pertence, falará em plenário depois. Na sequência, começa a votação. O primeiro será o relator, seguido dos demais ministros, em ordem do mais antigo para o mais recentemente empossado na corte.

Fischer divergiu de grande parte dos votos do ex-relator dos habeas corpus da Lava-Jato, o ministro Ribeiro Dantas. Enquanto Dantas mandava libertar os investigados, como os executivos da Odebrecht e da Andrade Gutierrez, Fischer defendeu a manutenção das prisões preventivas. No colegiado, os votos de Fischer eram seguidos pela maioria. Por isso, conforme prevê uma regra do Regimento Interno do STJ, ele substituiu Ribeiro Dantas na relatoria.

Caso o pedido de Lula seja negado, a defesa poderá recorrer ao STF. O relator da Lava-Jato na mais alta corte do país é o ministro Edson Fachin, que também tem tomado decisões severas em relação aos réus. Na Segunda Turma do STF, responsável pelos julgamentos da Lava-Jato, Lula já sofreu uma derrota. Em agosto do ano passado, o colegiado negou recurso da defesa e confirmou a decisão do ministro Fachin de mandar para Moro parte de depoimentos de executivos da Odebecht que citaram o nome de Lula.

Além desse novo habeas corpus que eventualmente poderá será apresentado ao STF, já há na corte outro apresentado pela defesa de Lula, também pedindo que ele possa recorrer em liberdade. Nesse caso, Fachin negou liminar por motivo técnico: como o STJ ainda não tinha julgado o caso em definitivo, ele não poderia examiná-lo. Fachin, no entanto, enviou o habeas corpus para o plenário do STF se manifestar.

Caberá à presidente do tribunal, ministra Cármen Lúcia, marcar a data desse julgamento, o que ainda não foi feito. Se isso ocorrer, poderá inclusive haver uma nova mudança no entendimento sobre o momento em que um condenado pode ser preso.

No habeas corpus apresentado ao STJ, a defesa de Lula sustenta que a súmula do TRF4 que determina o cumprimento obrigatório de pena após condenação em segundo grau não corresponde à orientação do STF, que autoriza a execução antecipada da pena, mas não torna essa possibilidade obrigatória. Seria preciso fazer a análise caso a caso. Caso o pedido seja negado, a defesa ainda pode apresentar embargos de declaração à Quinta Turma do STJ.

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