MPF repudia agressão a quilombola em Portalegre/RN

Polícia apura crime de tortura contra quilombola amarrado e agredido no RN  - 14/09/2021 - UOL Notícias

Procedimento apura violações a direitos coletivos por desrespeito à honra e à dignidade da comunidade quilombola

O Ministério Público Federal (MPF) no Rio Grande do Norte manifestou indignação pelos atos de violência praticados contra um quilombola da comunidade do Pêga, no município de Portalegre/RN, veiculados em vídeo na imprensa nacional nesta terça-feira (14). O homem negro – reconhecido como quilombola pela Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) e pela Coordenadoria de Políticas Públicas de Promoção da Igualdade Social do Rio Grande do Norte (Coeppir) – foi agredido e imobilizado, com seus punhos e pernas amarrados em uma corda.

Em nota pública, os procuradores da República Camões Boaventura e Renata Muniz ressaltaram a proteção constitucional, legal e de tratados internacionais às comunidades tradicionais. O MPF acompanha a investigação criminal conduzida pela Polícia Civil e instaurou procedimento para adotar medidas no âmbito dos interesses coletivos violados no caso, na Procuradoria da República no Município de Pau dos Ferros/RN.

Comunidades tradicionais – Camões Boaventura e Renata Muniz são os representantes no RN da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão (6CCR), câmara temática sobre populações indígenas e comunidades tradicionais. O órgão trata especificamente dos temas relacionados aos grupos que têm em comum um modo de vida tradicional distinto da sociedade nacional majoritária, como indígenas, quilombolas, comunidades extrativistas, comunidades ribeirinhas e ciganos. O objetivo é assegurar a pluralidade do Estado brasileiro na perspectiva étnica e cultural, como determina a Constituição Brasileira.

Confira a nota na íntegra:

NOTA PÚBLICA

O Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte, por meio dos representantes da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão, signatários da presente nota, vem a publico manifestar seu mais veemente protesto aos atos de violência praticados em face de um quilombola da comunidade do Pêga no Município de Portalegre/RN.

A imprensa nacional reproduziu um vídeo gravado por moradores da região, no dia 11 de setembro de 2021, com o flagrante de agressões cometidas, em público, por um cidadão local contra um homem negro, que se encontrava, de bruços, imobilizado, com seus punhos e pernas amarrados em uma corda.

A condição de quilombola da vítima foi reconhecida pela Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ e pela Coordenadoria de Políticas Públicas de Promoção da Igualdade Social do Rio Grande do Norte (COEPPIR).1

Com efeito, a Constituição Federal de 1988 consagra a dignidade da pessoa humana, como fundamento do Estado brasileiro (art. 1º, III) e determina, como objetivos fundamentais da República, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária (Art. 3º, I); a erradicação da pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais (Art. 3º, III); e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (Art. 3º, IV).

No rol dos direitos e deveres individuais e coletivos, elencados no art. 5º, a Constituição Federal estabelece que ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante (inciso III); e que a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei (inciso XLII).

Por sua vez, a Convenção nº 169 da OIT, assegura, em seu artigo 3º, o pleno gozo dos direitos humanos e liberdades fundamentais dos povos indígenas e tribais, sem obstáculo ou discriminação, e estabelece que não deverá ser empregada nenhuma forma de força ou de coerção que viole tais direitos.

Importante enfatizar que a Convenção nº 169 da OIT possui efeito vinculante sobre o ordenamento jurídico brasileiro diante de seu nítido conteúdo normativo de direitos humanos, eis que goza de status materialmente constitucional.

O Ministério Público Federal, dentre outros legitimados, tem atribuição para atuar judicial e extrajudicialmente em casos envolvendo direitos de quilombolas e demais comunidades tradicionais, com fundamento no artigo 6º, inciso VII, alínea “c”, e artigo 5º, inciso III, alínea “c”, da Lei Complementar nº 75/93, uma vez que a tutela de tais interesses corresponde à proteção e promoção do patrimônio cultural nacional (artigos 215 e 216 da Constituição); envolve políticas públicas federais, bem como o cumprimento dos tratados internacionais de direitos humanos, notadamente da Convenção nº 169 da OIT.2

Nesse contexto, o Ministério Público Federal, ao tempo em que repudia os atos de violência física e o tratamento desumano e degradante concedido ao quilombola de Portalegre/RN, acompanha, com atenção, o desdobramento da investigação criminal deflagrada na Polícia Civil do Rio Grande do Norte, e ressalta que outras medidas também estão sendo adotadas pela Procuradoria da República no Município de Pau dos Ferros/RN, por meio de procedimento próprio, no âmbito da tutela coletiva.

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