‘Ninguém nunca acreditou que Temer fosse santo’, diz ‘Financial Times’

Michel Temer, presidente da República

Segundo a publicação britânica, quem vir a substituir Temer não tem ‘nenhuma escolha’ a não ser continuar as reformas

Célia Froufe, correspondente, O Estado de S.Paulo

Menos de 15 dias após publicar um caderno especial de oito páginas sobre o Brasil, destacando que a recessão dava sinais de que estava chegando ao fim, que o governo cortava gastos e dava andamento às reformas, o jornal britânico Financial Times apresentou em sua edição de hoje um duro editorial dizendo que o País precisa de “mãos políticas limpas” para tocar os avanços da Previdência e do mercado de trabalho e que a possibilidade de a recessão voltar, cresceu. “Ninguém nunca acreditou que (o presidente, Michel) Temer fosse santo”, trouxe a publicação.

O periódico continua dizendo que, mesmo antes de assumir o poder, depois que a presidente Dilma Rousseff sofreu processo de impeachment, Temer era conhecido como um negociador de portas fechadas e que já estava contaminado pelo processo de investigação de corrupção denominada Lava Jato. Lembra que, no início de seu mandato, três ministros foram forçados a renunciar. “Ainda assim, embora sua administração não tenha sido menos corrupta do que a de Rousseff, era mais competente e desfrutava do apoio do Congresso”, avaliou.

O veículo destacou que, quando o Congresso derrubou Dilma no ano passado, os investidores compraram a tese de que suas políticas populistas minaram a economia: a inflação, o desemprego e a dívida do País estavam aumentando e a moeda havia desmoronado. A remoção de Dilma restauraria a confiança, reverteria uma recessão de dois anos e daria um tom mais positivo ao mercado financeiro. Até este mês, comentou o FT, tudo ocorreu como imaginado, até que o novo presidente se envolveu em um escândalo, acusado de ter aprovado pagamento de subornos, conforme gravação feita por um empresário.

Da saída de Dilma até este episódio, a ortodoxia econômica começou a retornar. “Difíceis, mas necessárias, as reformas trabalhista, previdenciária e de segurança social começaram a avançar no Congresso. A inflação caiu, permitindo que o Banco Central cortasse as taxas de juros. Apesar dos baixos índices de aprovação de Temer, a confiança das empresas aumentou”, enumerou o periódico.

Para a publicação, no entanto, essa tese otimista foi colocada em xeque com a possibilidade de Temer também ser forçado a deixar o cargo. O editorial citou que as provas contra o presidente são inconclusivas, que ele afirmou ser inocente e que ainda se mantém mais forte do que Dilma estava um ano atrás. “As elites políticas e empresariais sabem que a recuperação sustentada depende de suas reformas. Sua coalizão está desmoronando, mas ainda não desmoronou; uma das razões é que Temer não tem nenhuma substituição clara. Dilma, pelo menos, tinha um vice-presidente ansioso para tomar seu lugar.”

A avaliação do Financial Times é a de que rapidamente Temer está perdendo apoio no Congresso, nas ruas e “talvez no judiciário” e que o “Temergate” estancou suas reformas. O veículo comenta também que o jornal O Globo, que trouxe o teor das gravações à tona, classificou o presidente de “descartável”. A permanência no poder, conforme o veículo, pode ser mais uma causa do que uma solução para a crise. Mais uma vez comparando o caso ao famoso episódio de corrupção norte-americano, conhecido como Watergate, Temer estaria apenas buscando um perdão antes de renunciar.

O editorial mostra, então, as possibilidades de afastamento do presidente e diz que há chance de haver um interino escolhido pelo Congresso até a eleição presidencial do ano que vem. “Duas remoções presidenciais em dois anos seriam notáveis. No entanto, os mercados estão se mantendo”, comparou. O seu substituto não teria escolha se não continuasse as reformas, de acordo com o FT e, por esta perspectiva, de acordo com o jornal, quanto mais cedo ele sair, talvez seja melhor para o País.

Por fim, o jornal opina que o País não enfrenta uma crise financeira iminente, mas que a chance da retomada da recessão aumentou. “Politicamente, o futuro está bem aberto. “O expurgo de políticos corruptos, por meio do espectro ideológico, é necessário”, trouxe a edição acrescentando que todos os políticos ficaram em descrédito. “A percepção popular é de uma elite mais interessada em ficar fora da cadeia do que em governar. Esta é uma estrada perigosa que poderia criar uma abertura para oportunistas e populistas em 2018. Qualquer calma de mercado pode ser breve”, avisou.

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