Procuradora Raquel já contraria a bancada ruralista

No CNMP, a proposta da gestão de Raquel Dodge é colocar os assuntos de segurança pública dentro da esfera dos direitos humanos. A procuradora-geral, que preside o conselho, tentará uma ação articulada no Ministério Público, nas diferentes esferas e unidades da federação, com o Poder Judiciário e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Para isso, ela criou a Secretaria de Relações Institucionais, também com atuação vinculada ao gabinete da presidência do CNMP. Um entendimento vigente no grupo de apoio a Raquel, por exemplo, é que a política penitenciária no país fracassou — para além da ineficácia, contribui para o aumento da criminalidade a atuação de grupos organizados dentro dos presídios.

Os primeiros posicionamentos da gestão de Raquel já contrariam a bancada ruralista. O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Nilson Leitão (PSDB-MT), diz que a PGR deve atuar sem ativismo:

— Vou dar o exemplo do norte de Mato Grosso, o maior produtor de soja do Brasil. Imagina todo mundo que foi levado para lá, construiu cidades, está lá há 40, 50 anos, comprou, pagou por sua terra, pagou impostos durante 70 anos, e agora simplesmente o marco temporal é de 1934 e vai se dizer que existia lá uma reserva indígena de 12 índios numa área de 50 mil hectares! E todas as pessoas terão de ser desapropriadas. É preciso ter um pouquinho de cautela — afirmou o deputado.

O vice-procurador-geral da República entende que o marco temporal para demarcação de terras indígenas é o estabelecido desde a Constituição de 1934, e não uma linha de corte a partir de 1988, ano da Constituição vigente. Mariz Maia defende que decisões do STF, como a que eximiu a União de indenizar o governo de Mato Grosso por demarcações de terras, sacramentam esse entendimento.

CRÍTICAS A JANOT

Secretário-executivo do Centro Indigenista Missionário (Cimi), entidade ligada à Igreja Católica, Cleber Buzatto crítica a atuação de Janot. Segundo ele, foi uma gestão “bastante protocolar”, que quando instada a se manifestar sobre o tema, apresentou pareceres, mas não tomou a iniciativa de defender questões dos índios. Entre as medidas que ele acha importante serem tomadas por Raquel está a de investigar assassinatos de lideranças indígenas e quilombolas. Buzatto também espera que a procuradora-geral questione no STF o parecer da AGU que consagra o ano de 1988 como marco temporal para a demarcação de áreas indígenas:

— Eu acho que é uma iniciativa importante, uma vez que o presidente Temer não está respondendo às demandas dos povos indígenas, que, por meio de mobilizações políticas, têm cobrado a revogação desse parecer justamente por sua inconstitucionalidade.

Na posse, Raquel deu um tom religioso a seu discurso. Citou o papa Francisco, pediu a proteção de Deus e agradeceu a presença do núncio apostólico (embaixador do Vaticano) e do arcebispo de Brasília na cerimônia. O presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep), Antonio Maffezoli, diz não ver problema:

— Por decorrência da laicidade do Estado, as instituições públicas têm de agir independentemente das crenças pessoais de seus membros e de quem as lidera, porque é um momento passageiro.

O presidente da Anadep destacou que a gestão de Janot focou muito na parte criminal, e tem a expectativa de que Raquel priorize questões ligadas a direitos humanos, meio ambiente e índios.

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