Propina de Cabral pagou mãe, mulher, ex, filhos, irmãos, tia..

PF aponta que dez pessoas próximas receberam um total de R$ 7,3 milhões

POR MARCO GRILLO E MIGUEL CABALLERO – O Globo

Anotações apreendidas na casa do operador Luiz Carlos Bezerra indicam que o esquema de corrupção comandado por Sérgio Cabral (PMDB) abasteceu o ex-governador e outras dez pessoas do círculo familiar com R$ 7,3 milhões em propina, sempre em espécie, entre outubro de 2013 e outubro de 2016.

Os papéis, que deram origem a um relatório detalhado da Polícia Federal (PF), mostram que o mecanismo funcionou até a antevéspera da prisão de Cabral e aliados: há o registro de um pagamento de R$ 40 mil para que a governanta da casa do ex-governador, no Leblon, pagasse despesas da residência em 15 de novembro, dois dias antes da deflagração da Operação Calicute.

Ao GLOBO, por e-mail, a mãe de Cabral, Magaly, afirmou que o filho “vez ou outra mandava algum recurso”. Ela disse que não saberia “precisar valores” e que não conhecia a origem dos recursos.

O material colhido mostra que Bezerra movimentou R$ 37,6 milhões entre 2013 e 2016. Os recursos ilícitos eram enviados também para funcionários de Cabral e de Adriana Ancelmo, responsáveis por pagar as contas da casa, faturas dos cartões de crédito e outras despesas.

Na quinta-feira, em depoimento ao juiz Marcelo Bretas, Bezerra confirmou que recolhia dinheiro de propina em empresas e transportava os valores, sob as ordens de Cabral. Os pagamentos foram direcionados para a mulher do ex-governador, Adriana Ancelmo; a ex-mulher, Susana Neves; os três filhos do primeiro casamento — o deputado federal Marco Antônio Cabral (PMDB), João Pedro e José Eduardo; a mãe, Magaly; os irmãos, Maurício e Cláudia; uma sobrinha, Maria; e Fanny Maia, tia de Adriana Ancelmo.

Todos eram identificados por codinomes, como “BD” (Cabral), “Covitch” (Maurício), “Susi” ou “Manoel” (Susana) e “Boys” ou “Kids” (os três filhos). O irmão de Cabral recebia remessas frequentes de R$ 15 mil e, durante a audiência, Bezerra explicou que se tratava de uma “mesada” paga pelo ex-governador. “Mas ele não trabalha?”, interrogou Bretas na ocasião. Também há pagamentos de R$ 20 mil para o filho João Pedro com a indicação de que seria uma mesada. Foram feitos 182 repasses ao grupo.

Os representantes das empresas que contribuíam também eram identificados por apelidos. “Disney” era a referência à Tânia Fontenelle, da Carioca Engenharia, enquanto Xerife era a alcunha de Gustavo Estellita, empresário que está preso e é ligado ao Grupo Oscar Iskin, que vende equipamentos hospitalares.

Bezerra contou ainda que recolheu propina na Viação Flores, companhia de ônibus com sede em São João de Meriti, na Baixada Fluminense — a empresa era identificada como “Flowers”. O operador disse ainda que o empresário Georges Sadala, ligado a Cabral, também contribuiu com o esquema e era apelidado de “Salada”. Já Marco Antônio de Lucca, da Masan, aparece nas anotações como “Loucco”. Ele foi levado coercitivamente a depor na Operação Quinto do Ouro, que prendeu cinco conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE), soltos posteriormente. Há uma investigação em andamento que apura se empresas da área de alimentos, como a Masan, subornavam agentes públicos para conseguir contratos com o estado.

O relatório da PF cita que Bezerra também recolhia o dinheiro que seria repassado aos familiares com um portador dos doleiros Marcelo e Renato Chebar, que lavavam dinheiro para o grupo de Cabral no exterior. Outra fonte era o operador Sérgio Castro de Oliveira, conhecida como “Serjão” ou “Big”.

Magaly Cabral disse que, ao ser questionado, o ex-governador afirmou que o dinheiro vinha de aplicações financeiras.

 

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