‘Se ceder mais, vira reforma água com açúcar’, diz Rodrigo Maia sobre Previdência

Ponte

Para presidente da Câmara, servidores públicos querem inviabilizar a reforma da Previdência

Igor Gadelha, Idiana Tomazelli e Adriana Fernandes, O Estado de S.Paulo

Sob a ameaça de novas mudanças desfigurarem o texto da reforma da Previdência, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acusa os servidores públicos de tentarem inviabilizar a reforma. Maia, um dos principais articuladores do governo, diz que o relator, deputado Arthur Oliveira Maia (PPS-BA), já está no limite da capacidade de negociação. No seu cálculo, as alterações já consumiram 40% da economia prevista, quase o dobro do que estimou o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. A seguir, os principais trechos da entrevista.

A reforma trabalhista contaminou a da Previdência?

Não. Acho que a reforma trabalhista nos deu uma capacidade inicial de reorganizar o voto da aprovação das duas reformas.

Mas a trabalhista obteve 296 votos favoráveis, menos do que os 308 necessários para aprovar a Previdência.

Aí tem de lembrar que tivemos algumas derrotas ao longo dos últimos 30 dias e os líderes da base conseguiram recuperar pelo menos 60 votos. Sabemos que não temos esses 296 ainda para a Previdência, mas há uma capacidade de articulação melhor do que tinha antes.

Quantos votos a base tem hoje?

Não sei, não dá para falar em número. O que tem de fazer agora é organizar cada um dos partidos. Eu sou daqueles que prefeririam votar um texto mais duro para o servidor público, mais ou menos na linha do que veio do governo. Porque o servidor, onde estão os maiores salários, não entende que a (reforma da) Previdência vai beneficiar a todos.

O relatório endureceu as regras de aposentadoria integral de servidores. Isso pode cair?

Mas ele (relator) não mudou isso ainda.

Ainda? 

Ele não vai mudar. Ele tem o compromisso conosco de não mudar isso

A grande influência dos servidores sobre o Congresso não pesa?

É verdade, é a maior força. Esse é o problema. A gente tem de ter coragem de falar. É uma derrota, uma irresponsabilidade, um desrespeito com os brasileiros. São 5%, 10% da população que estão fazendo um lobby enorme na Casa, tendo vitórias há anos, aumentando seu poder há anos, em detrimento do gasto com educação, do gasto com saúde, do gasto em segurança pública.

Essa flexibilização não passa?

Se o relator ceder mais, vira uma reforma água com açúcar. Flexibilizar mais é não ter reforma. A gente precisa ter coragem de enfrentar o tema, ir pro voto. Nós já perdemos com as negociações 30%, 40% daquilo que estava projetado no início. Esse é o dado verdadeiro, não adianta se enganar.

Mas a Fazenda diz que a perda foi de 24%. 

Eu quero falar a verdade: não é 24% do meu ponto de vista. Eu não fiz a conta, mas economistas em quem confio dizem que é próximo a 40%. O falso prejuízo eleitoral no curto prazo com a votação da reforma da Previdência será muito maior se ela não for aprovada. Certamente a taxa de crescimento, que pode ser no ano que vem da ordem de 4%…

Chega a 4%?

Tenho convicção que, se a reforma da Previdência for aprovada com o texto nesse limite de hoje, mesmo com o dano que já foi feito no texto, temos condições de ter um crescimento muito alto no próximo ano. Agora, toda nova negociação é para atrasar o processo e inviabilizar a reforma.

É o que o servidor público está fazendo?

O servidor público quer inviabilizar a reforma. De uma forma ou de outra, eles acham que o governo brasileiro não está quebrado, que não existe déficit da Previdência.

Por que as ruas estão reclamando das reformas?

Quem reclama são os sindicatos, que estão mobilizados. A sociedade não está reclamando.

A greve geral de sexta-feira pode pressionar os deputados?

Não foi greve geral. Foi uma mobilização de sindicatos. Não tem nenhum efeito. Se não teve para manter o imposto sindical, que era maioria simples…

O governo está falhando na comunicação?

Não é que está falhando. Mas ele tem de mostrar o que aconteceu naqueles Estados brasileiros e naqueles países que foram obrigados a fazer reformas muito duras, qual é o impacto na vida das pessoas. Em Portugal, pensões, aposentadorias e salários foram cortados. Nós estamos, talvez pela última vez, tendo a oportunidade de fazer uma reforma sem cortar salários e aposentadorias e sem aumentar impostos.

Se as reformas não forem aprovadas, é fim do jogo para o presidente?

Não. Eu ouvi isso de um deputado da oposição que me assustou: “Olha, se o Michel não aprovar a Previdência, acabou o governo”. Eu fiquei olhando e perguntei: isso significa que você quer que a população brasileira pague um preço altíssimo porque você é contra o governo do presidente? Quando eu era mais jovem, fui um pouco assim, mas mudei minha posição. Conseguiremos ter a maioria para aprovar. Mas chega uma hora em que não pode ceder tudo. Se ficar cedendo tudo, acaba desmoralizado.

Qual é a receita para aprovar a Previdência?

Mostrar para o deputado: olha aqui esse servidor público do Rio que está recebendo cesta básica, aposentado que não tem dinheiro para comprar remédio… Isso vai acontecer no Brasil. Não representamos essas corporações que estão aqui tratando apenas dos seus interesses específicos. Nunca vi uma corporação chegar na Câmara e tratar do interesse coletivo. Aliás, só uma vez, quando o (Rodrigo) Janot (procurador-geral da República) levou o texto de abuso de autoridade.

As corporações de servidores dominam a base parlamentar?

Eles não dominam a base parlamentar. Os parlamentares muitas vezes preferem não enfrentá-los. Agora é hora de salvar o Brasil. A reforma da Previdência é meio que o coração do que o governo precisa fazer.

O presidente Temer vai ter margem para cobrar quem está votando contra?

O presidente, antes de assumir, lançou o documento “Ponte para o futuro”. Quem acompanhou sabia, se o impeachment saísse, qual era a agenda do governo. Ninguém pode dizer que foi enganado pelo governo da agenda da reforma previdenciária, da trabalhista, amanhã da reforma tributária. <MC>

Então quem aderiu ao governo e não concorda com reformas tem de entregar esses cargos?

Se eu tenho um ministério e digo “eu discordo da reforma da Previdência”, acho que tem de sair do governo.

Avaliação recente é de que muitos já estavam abandonando o barco do governo. O sr. vê isso?

Não é isso. É o seguinte: o deputado está olhando a votação e fala ‘tudo bem, estou aqui para ajudar, mas quero saber quais são as condições para ajudar, para que eu esteja fortalecido na minha base eleitoral’. Às vezes é o presidente da República ir na cidade da pessoa e visitar o prefeito dele com ele, tá resolvido. Às vezes é uma obra, não é isso? Às vezes é o fortalecimento de uma estatal na região dele. Cada deputado chega aqui de uma forma. Resolver o Funrural é uma tese que fortalece a base do Michel no agronegócio, que tem uma base de deputados importante. Então é óbvio. Agora vai se resolver a questão da contribuição previdenciária dos municípios, aquilo que está tudo atrasado, para parcelar novamente. Com isso, você está atendendo a uma base de deputados que têm relação com municípios menores.

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