Só 1% dos projetos de deputados que tentam a reeleição em 2018 viraram lei

Plenário da câmara com poucos deputados durante uma Comissão Geral, na volta do recesso parlamentar

Autores de aproximadamente 10 mil propostas legislativas nos últimos quatro anos, deputados federais que buscam reeleição viram apenas 1% desse total ser transformado em lei.

Levantamento feito pela Folha detalha a atividade parlamentar dos 452 deputados que assumiram o mandato em algum momento desta legislatura e agora buscam a reeleição em 2018.

Nos últimos quatro anos, foram aprovados 114 dos 10,2 mil projetos apresentados por esses parlamentares. E 80% dos deputados que tentam recondução não conseguiram transformar em lei nenhuma das propostas que apresentaram.

É o caso de Carlos Bezerra (MDB-MT). Autor de 210 propostas protocoladas desde 2015, ele encabeça a lista dos que apresentaram o maior número de proposições. Nenhuma, porém, foi aprovada.

“A tramitação lá da Câmara é lenta. A burocracia ali é infernal. Deviam ser mais rápidas as coisas ali”, afirma.

Do outro lado, os parlamentares que mais aprovaram projetos nesta legislatura foram Paulo Teixeira (PT-SP), Laura Carneiro (DEM-RJ), Diego Garcia (Podemos-PR) e Evair Vieira de Melo (PP-ES), com três aprovações cada.

Apenas um dos parlamentares, porém, apresenta índice de 100%. O suplente Flavio Nogueira (PDT-PI), que teve breve passagem pela Casa entre 2015 e abril de 2016, assinou a autoria de apenas um projeto, que virou lei. 

O texto é a polêmica aprovação da fosfoetanolamina, a “pílula do câncer” cujo estudo foi descontinuado por falta de eficácia e que teve seu uso aprovado pelo Congresso em 2016.

Além dele, também assinam o texto do remédio a deputada do DEM (Carneiro) e o deputado do Podemos (Garcia), além de outros 15 deputados.

Parte do que foi aprovado teve como autor mais de um deputado. É o caso da cessão onerosa, que altera regras do pré-sal. A proposta foi apresentada em 2016, concluída em 2018, e é atribuída a sete parlamentares.

“É importante aprovar com vínculo com a sociedade”, afirma Paulo Teixeira. Entre os projetos aprovados pelo parlamentar está o que regulamenta que os prazos do processo trabalhista são contados somente em dias úteis.

Ele afirma que o baixo número de aprovações se deve à Mesa Diretora da Casa, que tem prerrogativa de pautar.

“O foco deles não é o de aprovar boas matérias, estão muito subjugados ao interesse do Executivo”, diz. 

Alguns dos projetos aprovados pelos campeões de rendimento são simbólicos. É, por exemplo, o caso do Dia Nacional do Ciclista —assinado, entre outros, por Vieira de Melo e Paulo Teixeira— ou o Dia Nacional do Exportador, de autoria de Garcia.

Segundo o professor emérito do instituto de ciência política da UnB (Universidade de Brasília) David Fleischer, o alto número de projetos apresentados pode ser explicado por uma necessidade dos parlamentares de “mostrarem serviço” para suas bases, a fim de garantir a reeleição.

“Ele apresenta uma coisa que é inviável, que não é levada adiante nem pelo líder do seu partido, para mostrar ao seu eleitorado que está trabalhando. O eleitor não vai saber se foi aprovado ou não, mas ele vai se vangloriar, pode dizer ‘apresentei para beneficiar vocês’”, diz.

Na avaliação de Mozart Vianna, que trabalhou no Legislativo por 40 anos, 24 deles como secretário-geral da Mesa, a atuação parlamentar não é medida apenas pelo número de projetos que vão até o fim.

“Ele pode também ser relator, debater, emendar. Às vezes ele não é o autor do projeto, mas fez emendas importantes a ele”, afirma.

Vianna explica que propostas vindas do Executivo tendem a tramitar mais rápido que aquelas apresentadas por parlamentares e que, por isso, muitas vezes são encampadas pelos deputados em detrimento de seus próprios textos. Isso porque as propostas do governo tendem a ter prioridade, muitas vezes com urgência constitucional.

Além disso, é possível juntar projetos que tratem do mesmo assunto. 

“E na hora de votar, depende de acordo político, que [o parlamentar] não tem. Apresentar projeto é uma coisa, aprovar é outra”, afirma.

Folha também analisou o comportamento em votações de grande repercussão dos últimos quatro anos.

O levantamento mostra que entre os parlamentares que tentam reeleição e votaram no processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), 70% foram a favor da perda do mandato da petista.

O apoio à regra que estabeleceu um teto para o crescimento dos gastos públicos ultrapassou 75%. Na análise da reforma trabalhista, 62% dos que participaram da votação foram a favor do projeto.

Os dados mostram ainda que a maior parte deles votou pelo arquivamento das denúncias de corrupção que envolveram o presidente Michel Temer (MDB).

Os deputados que tentam renovar o mandato faltaram, em média, a uma de cada quatro votações em plenário.

O número inclui as ausências não justificadas e as justificadas, como as relacionadas a problema de saúde, missão oficial ou atividade parlamentar nos estados. Nesses casos, não há desconto no salário do deputado.

Entre os que cumpriram os quatro anos de mandato, José Otávio Germano (PP-RS) foi o que mais faltou às sessões, com 619 ausências em 854 votações —72% do total.

A equipe do parlamentar afirma que ele sempre foi assíduo às sessões, mas um problema de saúde fez com que se afastasse em ocasiões deste mandato, com a devida justificação à Casa.

No caso de licença por mais de 120 dias corridos, o deputado deve ser substituído pelo suplente. O gabinete de Germano informou que os afastamentos dele não atingiram esse prazo em nenhuma das ocasiões.

O levantamento da Folha também detalha a evolução do patrimônio desses parlamentares. Com a maior variação percentual aparece a deputada Tereza Cristina (DEM-MS), que multiplicou o patrimônio declarado em quase 500 vezes —de R$ 10,3 mil em 2014 para R$ 5,1 milhões neste ano.

A deputada afirmou que declarou neste ano seu patrimônio em conjunto com o marido, que teria recebido uma herança, o que explicaria o crescimento de 2014 para cá.

No sentido oposto há, por exemplo, o deputado Alfredo Kaefer (PP-PR), que declarou ter perdido 99% do patrimônio, caindo de R$ 108,6 milhões em 2014 para R$ 1,3 milhão neste ano.

O deputado explica que, em processo judicial que envolveu a falência de uma das empresas da qual era sócio, o juiz retirou quase todos os bens de seu controle patrimonial.

Ele diz que conseguiu reverter a sentença, mas ressalta que, ainda assim, perdeu muito dinheiro.

Bernardo Caram , Angela Boldrini e Daniel Marian – Folha de São Paulo

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