TCU decide que governo fez promoção pessoal de Bolsonaro em rede social

Postagem de 01.Setembro.2020 na página da Secom do governo Bolsonaro - Reprodução

Os ministros do TCU (Tribunal de Contas da União) decidiram por unanimidade nesta quarta-feira (18) que publicações feitas pela Secom (Secretaria Especial de Comunicação) no Twitter constituíram promoção pessoal do presidente Jair Bolsonaro e do ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, o que é vedado pela Constituição. O acórdão aprovado pelo TCU por unanimidade advertiu a Secom a parar com publicações do gênero, sob pena de ser multada.

O processo foi aberto a partir de representação protocolada pelo Ministério Público junto ao TCU em dezembro passado, conforme a coluna revelou em janeiro. O procurador Júlio Marcelo de Oliveira listou 34 publicações na conta da Secom no Twitter copiadas em dois meses de 2020, agosto e setembro. Depois, em um anexo, juntou mais cinco, de dezembro.

Procurado pela coluna para comentar a decisão do TCU, Oliveira disse que a considerou “correta, mas insuficiente, uma vez que não responsabiliza nem pune ninguém”.

Em 1º de setembro do ano passado, a Secom publicou na sua conta oficial uma foto de Bolsonaro abaixo de um anúncio, em letras garrafais, sobre o “auxílio emergencial prorrogado”. Em outra, ele aparecia com a mão sobre o peito ao lado de uma declaração a respeito de “Deus, pátria e família”. Numa terceira, o presidente dizia que “eu sou igual a vocês, ou estou à frente e junto ou não estou fazendo um bom papel”.

Postagem de 18.Setembro.2020 na página da Secom no Twitter - Reprodução - Reprodução

Outras quatro publicações exaltaram o ministro Tarcísio Freitas. Em uma postagem compartilhada pela Secom, o ministro segurava um cheque fictício de R$ 5 bilhões que teriam sido pagos à União por uma concessionária do setor ferroviário.

A área técnica do tribunal identificou promoção pessoal de Bolsonaro nas postagens. De acordo com os técnicos, a prática é proibida pelo artigo 37 da Constituição. “Verifica-se que as postagens da Secom são caracterizadas pela utilização de nomes, símbolos e imagens de autoridades e servidores públicos, e pela publicação de objeto [discursos e falas] cuja divulgação não é autorizada pela Constituição. Em ambos os casos, há violação constitucional”, apontou o relatório técnico de seis páginas.

Área técnica do TCU diz que argumentos do governo não eliminam irregularidades

Em manifestação de maio passado, a Diape (Diretoria de Fiscalização das Ações Estratégicas do Poder Executivo) do TCU concordou com as conclusões da área técnica do tribunal.

“Quanto às peças publicitárias mencionadas na representação em comento, a maioria delas, na verdade, trata de promoção pessoal dos agentes públicos envolvidos, no caso, o Presidente da República e o Ministro da Infraestrutura. Tome-se por exemplo a postagem do dia 27/8/2020 (peça 1, p. 17), onde aparece a imagem do Ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, dizendo: “…estamos falando de legado e o governo do Presidente Jair Bolsonaro vai deixar legado para o Paraná. Serão 2.400 km de novas duplicações”, diz o relatório.

O documento da Diape diz ainda que “os argumentos apresentados pela Secom não se mostram suficientes para elidir [eliminar] as irregularidades apontadas pela representação formulada pelo MP/TCU, configuradas na utilização de publicidade governamental para promoção dos agentes públicos envolvidos, no caso, Presidente da República e Ministro de Estado da Infraestrutura, em afronta ao disposto no art. 37, § 1º da CF, que preceitua: ‘A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos'”.

O processo foi relatado pelo ministro Vital do Rêgo e levado a julgamento no plenário do TCU nesta quarta-feira (18). Os ministros decidiram conhecer da representação e, “no mérito, considerá-la procedente”.

Postagem de 15.Setembro.2020 na página da Secom do governo Bolsonaro - Reprodução - Reprodução

Os ministros determinaram que a Secom seja cientificada de que “a divulgação de peças publicitárias, ainda que em redes ou mídias sociais e digitais, não vinculadas aos fins educativo, informativo ou de orientação social, que enalteçam nominalmente o Presidente da República, seus Ministros de Estado ou qualquer outro detentor de cargo político ou técnico da União ou de qualquer outro ente federado, caracteriza promoção pessoal da autoridade ou do servidor público, contrariando o disposto no artigo 37, § 1º, da Constituição Federal; e mais, que a violação de tais preceitos poderá ensejar a aplicação da multa prevista no inciso II do art. 58 da Lei 8.443/1992, conforme expressamente previsto no § 1º do artigo 45 da citada lei”.

A decisão foi considerada uma espécie de advertência. Caso o governo reincida na prática, os agentes públicos responsáveis poderão ser multados e processados.

Procurados na tarde desta sexta-feira pela coluna, a Secom e o Ministério das Comunicações não se manifestaram até o fechamento deste texto. Caso encaminhem uma resposta, este texto será atualizado.

No processo, a AGU (Advocacia Geral da União) e a Secom argumentaram, segundo o resumo produzido pela área técnica do TCU, que as publicações, “ao contrário do que se afirma, estão em perfeita sintonia com a Constituição, eis que almejam tão somente dar amplo conhecimento à sociedade de informações consideradas de interesse público, sejam elas a conclusão ou o início de determinada obra pública, a entrega de algum equipamento, o oferecimento de novo serviço público ou até mesmo a cobertura da agenda oficial do Chefe do Executivo, fato inegavelmente de interesse público, tanto que é diariamente repercutido por toda a mídia nacional”.

“Ou seja, não há promoção pessoal alguma, mas tão somente a concretização do princípio da publicidade e o respeito ao direito fundamental à informação do qual é titular todo cidadão”, diz a manifestação do governo, segundo o TCU. Os argumentos foram rejeitados pela área técnica e pelo plenário do TCU.

UOL

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